sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

LOROTAS DE PEDRO MARQUES (Por Brás da Viola)

A enchente de 1979


Constantemente estamos vendo em telejornais as notícias de alagamento, cheias terríveis que têm provocado um verdadeiro caos para muitas cidades, não é verdade? Tragédias com mortes e muita tristeza. A maior cheia de Jaíba que eu vi foi em 1979, quando ainda era uma criança de sete anos. Lembro-me que morávamos à beira do rio Verde, numa casa que tinha umas placas dizendo assim: “JEOVÁ ESTÁ NESTA CASA”. O rio cada vez mais enchendo, as pessoas passavam em frente nossa casa e gritavam:- Lá vem a água, Pedro Marques, corre se não você morre afogado! Às vezes aglomerava uma multidão à sua volta e ele dizia: - se a água chegar à minha casa eu bebo ela todinha de canudinho! Olha que o castigo veio a cavalo. De repente chega uma cheia tão grande que somente se via da casa a copa do telhado, consequentemente, fomos abrigados no antigo hotel da Ruralminas, onde hoje atualmente funciona o Cesi Senai. Fomos juntamente com outros flagelados. Mas o coração de Pedro Marques ficou mesmo na tão sonhada casa que construiras, ele pegava uma canoa e vinha remando até a casa... Quando chegava bem próximo, havia muitos moleques tomando banho em cima do telhado da nossa amada residência, e ele gritava com a espingarda na mão: Lá vai fogo tropa de vagabundos e “catapulta”, tiro pra todas as bandas, só via menino correndo. Lembrando que a espingarda era carregada apenas com sal grosso e havia um rapaz, mais conhecido como Jailson atentado, hoje motorista da prefeitura. Ele era um dos que atazanava Pedro Marques que lhe acabou acertando um tiro de sal grosso nas nádegas e o mesmo ficou hospitalizado 30 dias, sendo que o tiro também sapecou as suas duas pernas que ficaram salgadinhas. Passava-se a cheia e de novo estávamos lá, morando naquela inesquecível casa, que hoje só se vê as ruínas. Pedro Marques ganhou dinheiro e comprou um terreno no alto, onde hoje mora. Quando ele construiu uma nova casa ele disse: Agora eu quero ver, satanás levou uma fumada! Se eu aqui no alto morrer afogado, tenho certeza que vou ser o último, pois a cidade toda já foi primeiro. Dando sequência, quero relatar este fato durante a enchente. O autodidata não parava de extrair dentes! Colocava-se uma cadeira normal à beira do rio e só via agulha, boticão, algodão, metiolate e banguela pra todas as bandas, onde ele exclamava: Venha clientela, aqui está o autodidata cientista prefulgido PEDRO MARQUES DE OLVEIRA, aclarado e preparado para aliviar suas angústias... Já lavei as ferramentas nas águas ingratas deste rio, águas estas que nos expulsou de nossos lares, venha sofredores, corram depauperados e afugentados, venha tropa de zumbi que não dorme, eis o aliviador de suas enfermidades dolorosas e catastróficas, venha! É melhor a picada de uma agulha do que uma dor dente... Oh sofredores: É melhor uma dentadura mesmo machucando do que uma boca murcha, parecendo o cão chupando manga. Neste exato momento alguém senta à cadeira para extrair um dente; um cidadão mais conhecido pelo pseudônimo de “Baiano de Jula”, pai de Josué, Ednalva e de Jailson. O danado do dente foi extraído com muito sacrifício... Tendo Pedro Marques dito a uma multidão de clientes que assistia tal fato. Ele dizia: depauperados e massacrados ouvintes, amados dentuços e futuros banguelas: aqui está o troféu em minhas mãos, é este terrível e abominável dente, que agora vai ser lançado nestas águas assassinas como sacrifício, em prol das nossas dores. O “Baiano de Jula” foi até à beira do rio e lavou sua boca ensanguentada, logo em volta dele veio um cardume de piabas, isso devido à coloração sanguínea na água por ali. Pedro Marques vendo aquilo dizia: Os famintos e anêmicos peixinhos estão se deliciando deste banquete sanguíneo, vão ficar fortes e bonitos, eles comem o sangue e depois a gente come eles fritos e saborosos.