sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Governo quer reduzir propaganda de cerveja e o preço da “gelada” pode cair

O governo pretende disciplinar e diminuir a abusiva propaganda de cervejas, principalmente no meio televisivo. Esta medida poderá implicar no custo desta bebida para o consumidor, pois o custo maior deste produto é o imposto e a publicidade.
A justiça federal determinou no mês passado que a União e a Anvisa passem a aplicar novas restrições às propagandas de bebidas com teor alcoólico igual ou superior a 0,5 grau. A decisão, efetuada a pedido do Ministério Público Federal, estende aos anúncios publicitários de cervejas e vinhos. Limitações já previstas na Lei 9.294/96, que valiam apenas para bebidas com mais de 13 graus.
A decisão se aplica a todo território nacional e terá validade a partir de 180 dias depois da publicação do acórdão – limite do prazo para que os contratos comerciais sobre propagandas de bebidas alcoólicas sejam adequados à determinação. Ainda cabe recurso.
Entre as restrições previstas, está a limitação da exibição da publicidade das bebidas em emissoras de rádio e televisão apenas entre 21h e 6h, sendo que, até às 23h, apenas no intervalo de programas não recomendados para menores de 18 anos. Também fica proibida a associação do produto ao esporte olímpico ou de competição, ao desempenho saudável de qualquer atividade, à condução de veículos e a imagens ou ideias de maior êxito ou sexualidade das pessoas.
Além disso, há restrições referentes às embalagens dos produtos. Os rótulos das bebidas devem conter a advertência “Evite o Consumo Excessivo de Álcool”. Por último, os locais que vendem essas bebidas alcoólicas deverão fixar uma advertência escrita em sua parte interna alertando que é crime dirigir sob a influência de álcool, punível com detenção.
O Ministério Público Federal alegou haver evidências científicas de que ocorre a associação entre a publicidade e maiores expectativas do consumo de álcool, bem como o início precoce deste uso e um consumo mais intenso. O desembargador relator do processo, explica que, após a Lei 9.294, outras regras foram formuladas sobre o tema. A Lei Seca, por exemplo, passou a considerar alcoólicas todas as bebidas que contenham álcool em sua composição com grau de concentração igual ou superior a 0,5º grau. “O que simplesmente se fez nessa ação foi adaptar a lei anterior à posterior”, explica o desembargador.
A argumentação é que a regulamentação da publicidade tem o objetivo de garantir o direito à saúde e à vida dos brasileiros, principalmente de crianças e adolescentes. Baseado em diversos estudos citados na ação originária, que tem quase 100 páginas, o órgão sustenta que há uma associação entre a publicidade e o consumo de álcool, sobretudo o uso precoce.
"Verificou-se que existe verdadeira omissão por parte do Estado ao não cumprir disposição constitucional que obriga a regulamentação da publicidade de bebidas alcoólicas”, afirma o procurador Paulo Gilberto Cogo Leivas, um dos autores da ação.
Ele explica que, com a lei de 1996, “o legislador restringiu apenas a publicidade de altíssimo teor alcoólico, não abrangendo a maior parte das bebidas que são divulgadas e consumidas”. Para Leivas, a restrição atenderá ao objetivo constitucional de proteção prioritária às crianças e aos adolescentes.
“O objetivo da política pública, do Estado e da sociedade brasileira é proteger a saúde da população, o direito dos consumidores e das crianças. E a gente tem o alcoolismo e o consumo precoce de bebidas alcoólicas de crianças e adolescentes como um dos principais problemas de saúde pública no Brasil. Primeiro está a violência, depois o alcoolismo e a obesidade”, ressalta Ekaterine Karageorgiadis, advogada.
A adaptação do teor alcoólico para regulamentar a publicidade ao que está previsto em outras leis incomodou o segmento empresarial. Segundo o diretor de Assuntos Legais da Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abert), Cristiano Flores, ela pode ter “impacto gigantesco” na indústria da comunicação.
Flores criticou a decisão, que considera caber ao Legislativo e não ao Judiciário. “Quem acabou promovendo essa mudança na legislação foi o Judiciário, o que fere a separação entre os poderes”, opina. Para ele, “a questão não é se a cerveja é uma bebida alcoólica. A questão é como se dá o tratamento legislativo do tema e qual o nível de restrição você pode estabelecer”. A Abert vai recorrer da decisão nos tribunais superiores.
A Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (Cervbrasil) disse, em nota, que “prefere se manifestar somente quando a decisão for oficialmente publicada pela Justiça Federal”, sobretudo por evitar falar sobre processos ainda em andamento. O acórdão deve ser publicado nos próximos dias, segundo o tribunal.

A decisão vale para todo o país e dá prazo de 180 dias para a alteração de contratos comerciais de publicidade de bebidas alcoólicas, sob pena de multa diária R$ 50 mil, em caso de descumprimento.